Saiba reconhecer os sinais desse comportamento opressor que pode fazer com que você duvide de suas próprias percepções
Provavelmente, não é exagero dizer que toda mulher já passou por alguma situação em que alguém, geralmente um homem, e mais frequentemente o parceiro romântico (seja ele marido, namorado ou algo menos sério), questiona a autenticidade de um sentimento feminino de raiva, frustração ou tristeza em relação a algo feito pelo homem.
Esses questionamentos passam por alegar histeria, dizer que a mulher está sendo “dramática”, que ela é “louca”, que não há motivos para tanto, e que a mulher está “defensiva” e seguem na direção de questionar a própria memória da mulher (quando o homem insiste que disse algo que a mulher lembra claramente que não foi dito).
Esse tipo de comportamento masculino tem um nome e – cuidado! – é extremamente nocivo para a mulher. Ele se chama Gaslighting devido a um filme de mesmo nome.
O gaslighting pode ser qualificado como violência de controle/cerceamento ou também como violência psíquica/verbal. Em relação a esses tipos de violência, a pesquisa Mulheres Brasileiras nos Espaços Públicos e Privados, realizada em 2010, pela Fundação Perseu Abramo em parceria com o SESC, revelou dados alarmantes: 24% das mulheres entrevistadas afirmaram ter sofrido algum tipo de violência em forma de controle/cerceamento, e 23% passaram por violência psíquica/verbal.
Esses números podem não ser completamente precisos, uma vez que algumas mulheres não tem coragem que assumir terem sofrido violência. E, no caso do gaslighting, pode ser ainda pior, por suas características sutis, que serão apresentadas na sequência.
Luciana Kotaka, psicóloga e coaching de qualidade de vida de Curitiba, explica que o gaslighting é um comportamento que visa levar a outra pessoa a pensar que está louca, “que sua percepção a respeito de um fato está errada, que não sabe sobre o que está falando, que pode estar doente e psicótica. De uma forma mais resumida é promover a culpa na parceira, levando-a a achar que não tem noção de realidade, que situações onde a pessoa soube de algum fato ou presenciou não aconteceu, que são alucinações de sua mente, desmentindo as suas memórias. Levantar dúvidas, desmerecer sua percepção da realidade.”
Apesar de ser mais comumente direcionado contra mulheres pelos seus parceiros, a psicóloga alerta que “esse comportamento pode ocorrer também em outras formas de relações, como pais e filhos e até mesmo no ambiente de trabalho.”
Nesse tipo de relação, o abusador tende a distorcer, omitir ou mesmo inventar informações, fazendo a vítima duvidar de sua memória e sanidade. Ele também pode afastar a vítima de pessoas conhecidas, convencendo-a de que é o melhor a se fazer, ou que aquelas pessoas que foram afastadas eram pessoas ruins.
Conheça os sinais para identificar o gaslighting
Há alguns comportamentos que, quando identificados logo, podem evitar que você seja vítima de gaslighting. De acordo com Luciana Kotaka, desconfie se:
- O parceiro sempre tenta levar a pensar que você está sendo incoerente, que está inventando situações, vendo coisas onde não existem, que está enlouquecendo;
- Mesmo tendo certeza de algum fato, consegue se sentir culpada por estar acusando o outro, acreditando que possa estar errada e não enxergando a realidade;
- Você tende a aceitar agressões por achar que você mesma desencadeou o comportamento do outro;
- Mesmo tendo certeza que um objeto estava em determinado lugar, o parceiro afirma que não estava, afirmando que é você quem está mentindo, quando você;
- Começar a duvidar de forma constante de suas percepções, porque está se sentindo culpada com frequência ou mesmo errada;
- Seu parceiro tentar constantemente negar comportamentos que realmente teve.
Além desses sinais, comentados pela psicóloga, é importante ficar atenta quando:
- O parceiro insistentemente tenta te afastar de amigos e parentes, geralmente justificando que isso é para seu próprio bem. Diz que você acredita mais nas outras pessoas do que nele, e se faz de magoado;
- O parceiro começar a dizer que você é histérica, muito estressada, ou que não aceita brincadeiras;
- Ele tenta justificar agressões físicas ou verbais com argumentos como: “você me tirou do sério”, “eu estava bêbado”, “eu nunca faria isso com você, mas eu fiquei maluco de ciúmes”, entre outras falas semelhantes. Lembre-se, você nunca é responsável por qualquer tipo de violência que realizem contra você;
- Você se pergunta constantemente se é sensível demais, ou se está louca ou confusa;
- Você está sempre se desculpando para seu parceiro, e justificando para amigos e familiares as atitudes de seu parceiro;
- Você esconde acontecimentos negativos envolvendo seu parceiro de amigos e familiares para evitar ter de explicar ou justificar;
- Você sabe que há algo errado em seu relacionamento, mas não consegue identificar o que é;
- Você tem dificuldades em tomar decisões simples sem consultar seu parceiro;
- Você se questiona se você é uma esposa/namorada/pessoa “boa o suficiente”;
- Ele começa a acusar você de ter imaginação fértil quando você o questiona sobre a possibilidade de que esteja acontecendo alguma coisa fora do normal na relação (uma infidelidade, por exemplo);
- Ele te acusa de ser ciumenta, possessiva ou exigente quando na verdade nenhuma de suas ações levam a isso;
- Ele desvaloriza as suas opiniões, afirmando que, para seu próprio bem, você não deveria falar sobre um assunto determinado; ou assuntos “que você não sabe” (mesmo que saiba);
- Ele nega ter dito ou prometido coisas que você claramente se lembra de ele ter dito ou prometido;
- Ele te acusa de ter problemas de memória e manipula isso para fazer com que você faça ou aceite coisas que você não se lembra de ter dito que faria/aceitaria (pois você, de fato, não disse).
Isso não significa que você ficará o tempo todo imaginando que está sofrendo um abuso psicológico, porém, no caso de estar vivenciando alguma das situações acima, é importante ficar atenta, tentando evitar a manipulação.
A vlogueira Jout Jout comenta no vídeo a seguir alguns dos sinais mais recorrentes dos relacionamentos abusivos, os quais podem ter aspectos do Gaslighting:
O que fazer para se libertar?
Se você identificou em seu relacionamento algum dos sinais apresentados acima, é possível que você esteja sofrendo gaslighting. Se esse comportamento estiver apenas começando a te afetar, provavelmente será mais fácil de se livrar dele. Porém, se você já estiver mais envolvida na manipulação, a situação é um pouco mais difícil.
A psicóloga Luciana Kotaka explica que “é sempre muito difícil se livrar de condutas manipulativas, até porque os parceiros se adequam ao perfil do manipulador, são pessoas que estão mais suscetíveis ao desejo do parceiro. Há uma idealização do outro, a vítima permite que o outro assuma o lugar do saber.”
De acordo com Luciana, nesses casos, a vítima precisa da comprovação de algum fato que revele que o parceiro está mentindo. E mesmo com terapia, é um trabalho um pouco demorado, uma vez que a vítima acaba duvidando de si mesma e das pessoas ao redor. O trabalho do psicólogo, nesse caso, é fazer com que a paciente volte a acreditar nas próprias percepções e julgamento.
Assim, se achar que pode estar passando por uma situação como essa, não hesite em procurar ajuda de familiares, uma amiga ou amigo de confiança, ou ajuda psicológica especializada.
Fonte: https://www.dicasdemulher.com.br/gaslighting/